quinta-feira, 29 de março de 2007

Humanize já! (e viva o diálogo!)

Oi pessoal! Este é o meu primeiro post aqui no blog, mas não será um texto teórico ou didaticamente filosófico. Para falar a verdade, nem tem muito a ver com Sócrates ou com sua defesa, porém traz certa reflexão sobre o cotidiano e alguns questinamentos, o que não deixa de ser filosofia. Nessa semana, nosso grupo se reuniu na terça e na quarta-feira à tarde para elaborar o seminário sobre a Apologia de Sócrates, que vamos apresentar em Abril. Talvez seja típica a cena de um grupo um tanto numeroso de alunos se reunindo para fazer um trabalho (somos dez integrantes): começam bem, com certa seriedade se sentam juntos para discutir sobre suas tarefas, mas acabam puxando um assunto aqui e outro ali e, quando finalmente se dão conta, estão há muitos preciosos minutos conversando (porque, afinal de contas, todos querem terminar o trabalho o mais rápido possível, almoçar e se mandar para casa, certo?), contando casos e histórias, o que muita gente diz que é jogar conversa fora, ficar dispersando, viajando...só que nestes minutinhos muita coisa aconteceu e nem nos demos conta.
Quando paramos para conversar com uma pessoa de maneira informal, quebrando, de certa forma, nossa rotina ou planos, não deveríamos considerar que estamos perdendo tempo. Essa expressão "jogar conversa fora" nem deveria existir! Digo isso porque, se uma conversa com determinada pessoa for realmente tão descartável que não vá lhe acrescentar nada ou ainda aborrecê-lo, simplesmente ela não existirá. Será evitada. Por que nos daríamos o trabalho de passar uma parte de nosso tão precioso tempo fazendo algo tão inútil e não prazeroso? Dessa forma, acredito que, se paramos para falar com alguém, é porque há um bom motivo (mesmo que na hora a gente não perceba). Não estou dizendo aqui que o certo é parar todas as atividades do dia como trabalhos, aulas, leituras, etc. para ficar papeando, só que deveríamos dar mais importância e praticar mais o contato com as pessoas, o relacionamento humano, ao invés de nos contentarmos em "conversar" lendo mensagens numa tela de computador ou celular. O contato direto com o outro é fundamental na construção de um ser humano como indivíduo, como cidadão. Conhecer a história, as origens, gostos pessoais e opiniões diferentes contribui para com a diversidade e a convivência na sociedade, uma vez que, com o contato real, podemos nos colocar no lugar do outro e entender seu ponto de vista sobre o mundo, o lugar que ele ocupa. Como é bom poder descobrir coisas sobre seu colega que você nunca tinha imaginado, saber onde ele estudou, de onde ele veio, o que gosta de fazer em seu tempo livre; ficar sabendo que ele tem uma banda legal, que o outro gosta de ler quadrinhos, que a sua amiga mora em Santos, que seu outro amigo mora em Jundiaí (e chega em casa antes do que você, que mora em São Paulo - pasmem!)...além disso, é muito saudável a discussão de opiniões, a verdadeira troca de idéias e argumentos, aprender e ensinar com o outro. Tudo isso é muito importante!
Não é um absurdo o fato de já não conhecermos mais os nossos vizinhos? E de não cumprimentarmos aquelas pessoas que vemos todo santo dia no corredor, no elevador, na padaria, na biblioteca?
Encontrei o Dimas quando estava saindo da faculdade naquele dia e ele ficou muito feliz de saber que na nossa reunião de trabalho nós conversamos tanto. Até a redação da Ivonete tinha um questionamento no tema e nos textos de apoio que era muito parecido com o que escrevo aqui. Mas foi uma coisa que me fez parar pra pensar. Me lembrei da minha avó, que tanto se esforça para dar atenção a todos que estão à sua volta, incluindo os vizinhos, o porteiro, a cabeleireira. Nosso mundo hoje está cada vez mais individualista, artificial e frio. Não há respeito ou tolerância pelas diferenças entre cada um, as relações são falsas e superficiais. E só depende de cada um de nós mudar o jogo para construir uma sociedade um pouquinho mais humana, interessante e feliz. Então por que você não desliga seu computador, vai fazer um bolo e aproveita pra levar um pedaço pra sua vizinha?
Beijo pra vocês,
Bárbara

quarta-feira, 28 de março de 2007

ApologiaS. Plural.

O “Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa” define a palavra apologia como um “discurso para justificar, defender ou louvar”. Por esta definição, nenhum título teria sido mais apropriado para o volume escrito por Platão para narrar o julgamento de seu maior professor, Sócrates. Nele, enquanto Platão certamente discursa tanto quanto Sócrates ou seus acusadores mesmo não tendo sequer uma palavra atribuída à sua pessoa em “Apologia de Sócrates”, podemos observar as três intenções previstas pelo dicionário.

Em termos concretos, o livro descreve como Sócrates se defendeu das acusações de ensinar o mal à juventude ateniense e de, basicamente, desonrar os deuses. Mas também funciona como uma defesa da filosofia socrática frente aos pensamentos sofistas da época, ao mesmo tempo em que louva a retórica, a ética e noção de verdade e justifica todos estes conceitos frente aos valores da época que permitiram a injusta condenação de Sócrates à morte.

Da mesma forma, neste blog através deste ano, buscaremos de diversas formas justificar, defender e louvar o pensamento socrático como ele é descrito por Platão e ainda analisá-lo, compará-lo e até mesmo criticá-lo. Afinal, nosso objetivo maior, além de ampliar o nosso conhecimento e aprofundar o nosso discurso filosófico, é levar a quem possa ler nosso blog um bom entendimento sobre a obra de Platão e a influência de Sócrates não apenas neste aluno específico, mas na filosofia Ocidental como um todo e ao longo do tempo.

Acho que posso falar por todos no meu grupo de pesquisa quando digo que ninguém dentre nós almeja se igualar a Platão, nem compartilhamos de seu objetivo quando este escreveu “Apologia de Sócrates”. Mas, ainda assim, se não iremos a todos os momentos defender e louvar Sócrates, pelo menos faremos o melhor dentro de nossas capacidades para justificar, se não o pensamento Socrático em si, o infinito valor da obra de Platão para o campo da filosofia.

Texto por Carlos Senna.

sexta-feira, 23 de março de 2007

Filósofos x Sofistas: Quem venceu?

Gostaria muito de dar continuidade a essa discussão que começamos em aula, mas que não tivemos tempo de aprofundar. Sei que as opiniões vão divergir, mas eu creio que foram os sofistas. Portanto, como faria um bom sofista, prover-me-ei de argumentos para defender
minha posição.

Não há país plenamente desenvolvido no mundo que não possua leis, e onde há leis, há advogados, e onde há advogados: há sofistas. Todo o sistema de justiça moderno baseia-se em idéias sofistas, ou será que o certo e o errado dependem de algum outro fator se não da oratória do advogado? Ganha quem tem os melhores argumentos, ou quem consegue expressá-los da maneira mais convincente, e é justamente essa ausência de determinação entre o que é correto ou não que faz do direito uma “arte do sofismo”.

Entretanto, não foi só a justiça que o sofismo influenciou, basta observar a publicidade. Como dizer que um publicitário não é sofista na medida em que, em não raras oportunidades, ele tenta provar para outros que um produto ruim é bom? Nota-se aí novamente uma relativização da qualidade: O bom pode ser ruim, assim como o ruim pode ser bom. Para o sofista e para o publicitário, ambas as possibilidades podem ser válidas. Basta argumentar.

Mas e quanto à filosofia defendida por Sócrates, aonde a encontramos no mundo de hoje? Provavelmente em faculdades, livros filosóficos e dentro da mente de poucos que, diferentemente da maioria, adotam a idéia do “só sei que nada sei” e, a partir daí, seguem em busca de uma verdade absoluta. Agora, se depender da massa de hoje, só há uma verdade irrefutável: a morte. Sair à procura de outras é um trabalho árduo, pensar dói.

Enfim, espero ter sido convincente. De maneira resumida, creio que o sofismo “ganhou” porque, na prática, ele está muito mais presente no nosso cotidiano. Também não posso deixar de lamentar que seja assim, já que o ideal de justiça socrático é, sem dúvida, mais justo.


Abaixo, os links para dois sites que me pareceram muito bons:

.http://72.14.209.104/search?q=cache:rtK2lHzuXO8J:afilosofia.no.sapo.pt/10socrates.htm+filosofia+socrates+sofistas&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=8&gl=br

. http://www.mundociencia.com.br/filosofia/socrates.htm

Por Alessandro J. L. de Campos

quinta-feira, 22 de março de 2007

Utopia, John Lennon e Joseph Proudhon

A palavra utopia define um plano teórico que não pode ser realizado, e foi cunhada à partir da obra de Thomas Morus, Utopia, que descreve um país imaginário de mesmo nome.
John Lennon, em sua mais famosa canção, Imagine, descreve um mundo onde não há religiões, países, posses, ganância e fome. É, portanto, uma descrição utópica que tem como função, emocionar as pessoas que a escutam, provocando uma reflexão sobre o destino qual estamos levando o mundo, através de nossas atitudes.
Se Sócrates estava certo em afirmar que os poetas não detinham conhecimento algum – sobre suas próprias obras inclusive – e a composição de suas poesias se dava apenas por um impulso criativo, um dom natural, estado de inspiração, bem como “os adivinhos e os profetas” (palavras do próprio Sócrates, retiradas da “Apologia de Sócrates”, escrita por seu discípulo, Platão), então Lennon nada sabia sobre a Utopia de Morus, ou as teorias anarquistas de Pierre-Joseph Proudhon.
Nesse caso, acredito que o ex-beatle escreveu a celebrada música apenas movido pela sua paixão pelo mundo e o desejo de que a humanidade, um dia, viva em paz. No entanto, a relação com o mundo utópico de Morus e a anarquia de Proudhon é inevitável.
Uma análise da letra da música em questão permite ver claramente que há uma idéia comum a todos. Eles idealizam uma sociedade perfeita e justa e, por mais que os anarquistas não admitam, as três sociedades idealizadas por cada um são inviáveis do ponto de vista prático.
As críticas mais significativas que são comuns aos três estão a seguir:
“Imaginem não haver propriedades”, cantava Lennon. Esse trecho da música dialoga tanto com os pensamentos anarquistas, sintetizados pela frase “A propriedade é um roubo”, proferida por Proudhon, no século XIX, que deu título a uma de suas obras, quanto com o ideal utópico de Morus, que tempos antes, foi o precursor das teorias socialistas que tentaram criar uma sociedade baseada na comunidade de bens.
A crítica de Lennon à religião também é encontrada na Utopia, porém, nesse caso há uma divergência, posto que Lennon imagina a ausência de religiões, e Thomas Morus descreve um mundo em que apesar das religiões terem representações diferentes para povos diferentes, a maioria das pessoas(as mais sábias, de acordo com ele) reconhece um Deus único, supremo, e é a Ele que se prestam homenagens. Já a crítica anarquista à religião, consiste em não reconhecer as instituições religiosas(apesar de não serem ateus), essas que fornecem condições para a subjugação de uma classe por outra.
De qualquer forma, mesmo que com visões diferentes, os três autores em questão se relacionam, pois o produto final de suas idéias, é, grosso modo, o mesmo, ou seja, uma sociedade horizontal, sem hierarquias, na qual todos são livres e vivem em harmonia. “And the world will live as one”.


Texto por Fernando Mendes

quarta-feira, 21 de março de 2007

O interacionismo simbólico: Sócrates sob diferentes ângulos.



O professor Lira diria que para que possamos interagir com o mundo criamos símbolos. Criamos imagens, interpretações de como as coisas são para tentar compreendê-las e o nosso universo social, ou seja, o lugar do qual viemos e as experiências pelas quais passamos ajudam a determinar quais serão esses símbolos. Utilizando esse raciocínio, o que esse blog representa para mim não é o mesmo que representa para você leitor - que deve estar pensando que já viu posts melhores. Calma, este blog ainda se considera filósofo, só pegou emprestado uma teoria da sociologia para analisar um filósofo e as diferentes imagens dele. O amante do saber em questão não é qualquer um, é simplesmente aquele que apadrinha esta página: Sócrates.

Sócrates, como você já devem saber, nunca escreveu, e tudo o que sabemos sobre ele é graças a escritos de outras pessoas. Essas seriam: Platão, Xenofonte e Aristófanes. Outros autores também falaram sobre essa lendária figura, mas não tanto e de forma tão direta quanto os três acima.

Aristófanes narra o quão maléfica foi a presença e o pensamento de Sócrates para um filho que após a convivência com o filósofo se virou contra o pai. Apesar de mostrar o uso que Sócrates faz do diálogo para fazer com que o interlocutor caia em contradição, ele o faz de um modo cômico, tentando sempre representar Sócrates como um falso sábio, mostrar-lhe como sofista, ridicularizando-o. Algo que é compreensível se vermos que Aristófanes na verdade escrevia peças cômicas para teatro e que portanto, se fosse realizar uma obra, qualquer que fosse, ela teria naturalmente um tom cômico.


Já Xenofonte retrata um Sócrates austero, amante do trabalho no campo e da vida militar. Preocupa-se muito em registrar a vida correta e regrada do mestre, como alguém cheio de condutas morais, e para isso não se cansa de elogiar o esforço que o filósofo empenhava em seu trabalho. Percebe-se que o fato de Xenofonte ter sido militar a maior parte da sua vida influencia seu modo de ver Sócrates, ele só enxerga, ou dá mais ênfase, aos aspectos da vida do filósofo que são mais próximos de seu mundo cultural.

A visão de Platão é a que mais utilizamos em estudos e é também a que será apresentada pelos escritores desse blog ao final do bimestre. Não entrarei em detalhes sobre o conteúdo das obras desse autor que têm como personagem Sócrates (não só para preservar a surpresa como também para evitar conflitos dentro de uma equipe até agora harmoniosa). Por agora, o que nos interessa é o que Platão era e como ele via seu mestre. Platão foi discípulo desse filósofo nos tempos mais difíceis de sua vida, quando ele era jovem e o mestre, já velho. Declarava ser Sócrates o homem mais justo que jamais conheceu. O tipo de encantamento que vemos no discurso dele é daquele que causa cegueira em muitas pessoas e não as permite analisar seu ídolo da forma mais imparcial possível. Então porque confiar mais em Platão que em Xenofonte ou Aristófanes? A resposta pode estar apoiada justamente na sociologia, ciência que iniciou este post. Platão, ao contrário dos outros autores era filósofo e por isso a visão dele não é mais verdadeira que as outras, mas constitui um relato mais rico e portanto mais interessante para os estudos do que as obras de um comediógrafo ou de um militar.

Se algum dos autores mentia ou mascarava a verdade, como era o real Sócrates e se ele realmente foi tão genial quanto diz Platão acredito que nunca saberemos. Mas algo que não devemos nos esquecer é que mesmo o mundo que vemos não passa da nossa representação da realidade, dessa forma, se me perguntares qual era o real Sócrates, terei de responder com outra pergunta (bem no estilo socrático): Mas, e quem és tu, realmente?



Inté,

Laís


P.S: Dica de leitura:"Sócrates, o nascimento da razão negativa" de Hector Benoit.

terça-feira, 20 de março de 2007

Sócrates e a Telefônica

Olá, amigos. Eu me chamo Mariana e, toricamente, era pra eu ter postado isso ontem, mas fui prevenida por um feliz imprevisto com a Telefônica. Portanto a minha dissertação.

Sabiam que a Telefônica é, de certa forma, muito parecida com Sócrates?

Pra quem não sabe, Sócrates, nosso ilustre amigo Sócrates, foi um Ateniense que acreditamos ter nascido no ano 470 AC, na cidade estado de Atenas, Grécia. Ele viveu (e morreu) importunando as pessoas, como uma mosquito que obriga burros a se moverem... Sócrates, caros leitores, queria fazer as pessoas pensarem. Para isso, ele se utilizava de lógica e questionamento sistemático de todas as verdades estabalecidas, pois só assim, de acordo com ele, seria possível descobrir a Verdade.

A Telefônica se assemelha. Ela não é de origem grega, mas importuna a gente. E, se formos espertos o bastante, e tivermos a paciência de procurar informações em todos os seus ramais, nós aprenderemos muito. Lições de dúvida, paciência, espanto e eventualmente um aprendizado básico em informática. Tudo bem, não creio que ela faça isso no intuito de nos levar a essas lições... mas quantas chateações da vida, se encaradas como um convite à paciência e à filosofia, não se tornariam benéficas?

A moral da história, eu acho, é "não dêm cicuta, mas ao menos ameacem processar".

Abraços e até segunda que vem,

Mariana (Ma pra uns, Nyxx pra outros e... como o meu namorado me chama não é da conta de vocês!).

PS - cicuta foi o veneno que Sócrates usou pra se matar, após ser julgado de "corruptor da juventude ateniense". Mas isso é outra história.

terça-feira, 13 de março de 2007

A Ética e a Retórica - Como a retórica pode influenciar na ética?

Ética e retórica são dois conceitos tão antigos quanto a Grécia de Sócrates e dos Sofistas, os professores de retórica. E, assim como as idéias dos supracitados, esses dois conceitos continuam existindo e mais fortes do que nunca.

A ética consiste, basicamente, em julgar valores morais como certos ou errados, agir eticamente é buscar sempre ser justo, leal e correto. Retórica, por sua vez, é a “arte de falar bem”, “seduzir pela palavra”, é saber escolher os melhores argumentos e fundamentá-los de maneira eloqüente, persuasiva. Se, por um lado, a ética é o “conceito do bem”, a retórica pode, por vezes, adquirir um certo quê de maldade, se não bem utilizada.

A advocacia será a base dessa reflexão, por meio dela se estabelecerá a relação conflituosa entre retórica e ética. Advogar é, em princípio, ter um compromisso com a justiça e com o bem-estar da sociedade, fazendo-se punir os culpados e libertar os inocentes. Porém, a advocacia também exige que seus profissionais sejam verdadeiros ourives de palavras, eles precisam manejá-las sempre bem e a seu favor; entra, então, a retórica.

Advogados, portanto, precisam ser ao mesmo tempo éticos e detentores de uma boa fala. Caso as duas sejam usadas de maneira equilibrada, faz-se justiça. Mas, se a retórica se sobrepuser, há grandes chances de ocorrer corrupção no resultado final.

Não faltam exemplos do mau uso da arte de falar bem na justiça brasileira. Alguns casos emblemáticos são: o julgamento que deixou em liberdade o jornalista Pimenta Neves, assassino confesso de sua namorada; o caso do superfaturamento nas obras do TSE de Nicolau dos Santos Neto, entre outros. Em comum, esses dois casos apresentam clientes muito ricos e capazes de contratar os melhores advogados do Brasil; o problema, porém, parece residir justamente nesses gabaritados profissionais.

Cada vez mais competentes com as palavras, os advogados têm se tornado verdadeiros pupilos sofistas, e através de seus discursos levam o júri aos dóxai, extraindo a verdade mais conveniente para seus clientes. A verdade objetiva dos filósofos, nesse caso, é deixada de lado.

Há, então, um grande conflito entre o ser correto e o agradar ao mais poderoso. A retórica pura e simples tem vencido a ética. Ambas encontram-se em uma desarmonia perigosa, que pode selar destinos injustos, como os de Pimenta Neves e Nicolau dos Santos Neto.

A elucidação desse entrave parece não ser tão simples, uma vez que a justiça já se tornou um mercado, tendo os advogados como vendedores de libertação e seus clientes culpados, os compradores.

Talvez a única solução plausível seja a utilização em maior escala da alétheia dos filósofos. A justiça deve, sim, reduzir as chances de réus comprovadamente culpados. Os grandes advogados também deveriam rever seus conceitos e aplicar um pouco mais de ética ao escolher uma causa para defender.

Agni Berti

segunda-feira, 12 de março de 2007

Sócrates e "300 de Esparta" - A morte como triunfo

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket Este blog é dedicado à discussão filosófica, inspirada nas aulas de filosofia dadas aos alunos do 1º ano de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero pelo Prof. Dr. Dimas Künch e no pensamento do filósofo Sócrates, como ele é descrito no livro “Apologia de Sócrates” de seu mais ilustre aluno, Platão. Um homem cuja vida está, assim como diversas figuras da história antiga, marcada por incertezas e relatos conflitantes. No entanto, suas idéias consolidaram a base do nosso pensamento e filosofia moderna. E me parece fundamental e atípico que muito de sua importância para nós venha de sua morte, e não de sua vida. E é com algumas considerações sobre sua morte e com uma comparação que eu gostaria de iniciar minha colaboração.

Primeiramente, quero pedir desculpas a você que lê este texto. Ele não será breve, já aviso, mas este não é o motivo pelo qual me desculpo. Simplesmente venho dizer que, se aqui, logo de inicio, esperava encontrar uma análise ponderada do método Socrático, exemplos do uso da dialética, ou debates sobre Filosofia versus Sofismo, eu vou desapontá-lo. O que vou, sim, tentar fazer é, através da comparação com um fato histórico, ricamente representado numa recente obra de ficção, mostrar um pouco do contexto histórico no qual viveu Sócrates e fatos que podem ter influenciado o mesmo, numa tenra idade, no seu pensamento e posicionamento que eventualmente tanto determinaram seu julgamento e subseqüente morte.

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A obra de ficção mencionada acima é o filme “300 de Esparta” (“300”), baseado na premiada obra homônima em quadrinhos escrita e desenhada por Frank Miller (publicada pela Dark Horse Comics, de Maio a Setembro de 1998). A estória é baseada no relato histórico de Heródoto de Halicarnasso da Batalha das Termópilas. Segundo Heródoto, em Agosto do ano 480 a.C., 300 espartanos, aliados a mais de 5000 outros gregos de diversas outras cidades-estados, enfrentaram um exército Persa, liderado pelo imperador Xerxes I, que contava com cerca de 4,7 milhões de soldados.

Desde então, muitos historiadores tentaram desmistificar os números envolvidos nesta batalha e hoje se acredita que os gregos estavam em cerca de 14 mil homens e as forças persas contavam com 250 mil soldados. O fato é que o número exato de combatentes é irrelevante, especialmente se considerarmos que durante a época em que Sócrates viveu, os números descritos por Heródoto deviam ser considerados verdadeiros. Então, aqui, aceitaremos que o rei Leônidas de Esparta comandou um exército de 5,500 homens contra alguns milhões de Persas.

Sócrates nasceu em Atenas, no ano 470 a.C. num período de paz instável entre as duas maiores cidades-estados gregas. Durante sua vida, fez parte do exército de Atenas e existem muitos testemunhos documentais de seu valor durante batalhas. Batalhas estas lutadas durante a Guerra do Peloponeso (431 a.C. a 404 a.C.), na qual Atenas e seus aliados lutaram contra a Liga do Peloponeso, liderada por Esparta. Sócrates, apesar de nunca negar sua paixão por Atenas, parece ter sido crítico da democracia Ateniense e elogia direta e indiretamente Esparta em diversos de seus diálogos. Esta atitude foi um dos fatores que o levaram a ser julgado e condenado à morte.

A afinidade e admiração que se desenvolve entre oponentes numa guerra é fato e acontece com diversos indivíduos, mesmo que minha falta de conhecimento e pesquisa me impeçam de afirmar categoricamente que este foi o caso com Sócrates. Da mesma forma, é difícil dizer com absoluta certeza que a história dos 300 de Esparta tenha chegado aos ouvidos de Sócrates, muito menos que ela o tenha influenciado. No entanto, tanto a história da Batalha das Termópilas quanto a vida de Sócrates terminam em pontos comuns: O sacrifício da vida por um ideal, por um objetivo maior que o indivíduo. E este não é o único ponto comum.
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Durante o seu julgamento, Sócrates defende-se contando como seu amigo Xenofonte, indo à Delfos, consultou o oráculo perguntando se havia homem mais sábio que Sócrates. A pitonisa respondeu-lhe que não havia ninguém. Sócrates, em vez de sentir-se enobrecido por isto, contesta a alegação (que era na época como a palavra dos deuses) e parte em busca de evidência que corroborasse ou desmentisse a afirmação do oráculo. Discutindo com políticos e outros homens proeminentes da sociedade Ateniense, Sócrates chega a uma conclusão simples, porém controversa. Disse ele: “Parece, pois, que eu seja mais sábio nisso - ainda que seja pouca coisa: não acredito saber aquilo que não sei”. Com isso, dizia que muitos se passavam por sábios, mas pouco realmente sabiam daquilo que se propunham a debater.

Em “300 de Esparta” o rei Leônidas também consulta um oráculo, o que se diz na estória era a lei de Esparta antes de declarar guerra e começar uma campanha. E mesmo o rei deve obedecer à lei. Os sacerdotes do oráculo são descritos como velhos disformes, pervertidos e ávidos por ouro e riquezas. Sócrates teria os detestado tanto quanto Leônidas os detesta, por sua paixão por riquezas. Eles, no filme, lançam como obstáculo à campanha contra os persas a celebração de um festival religioso e, manipulando as palavras do oráculo, proíbem que Leônidas mobilize o exército. É por isso que Leônidas enfrenta Xerxes com apenas 300 soldados, pois estes eram sua guarda pessoal e somente eles poderiam ser levados sem que se quebrasse a lei. Mostrando assim, um grande amor pela pátria, que Sócrates também exibia, e também uma admiração respeitosa pelas leis. Este respeito pela ordem foi tão grande e tão óbvio que, no local onde a última batalha foi travada entre os persas e as forças do rei Leônidas, o poeta Simonides deixou este epitáfio numa pedra:

Estrangeiro que passas, diz a Esparta que teres-nos visto aqui jacentes
Obedecendo às santas leis da pátria.
(Traduzido para o português da tradução de Cícero para o Latim)

Este amor aparente pela lei também guarda uma pouco sutil acusação contra os oligarcas de Esparta, pois, se não pela manipulação das leis, talvez aqueles soldados pudessem ter sido poupados e uma vitória mais decisiva pudesse ter sido alcançada. E o respeito pela lei também aparece proeminente nos argumentos de Sócrates, quando este diz: “E, embora os oradores estivessem prontos a me acusar e me prender, e vós os encorajásseis vociferando, mesmo assim, achei que me convinha mais correr perigo com a lei e com o que era justo, do que, por medo do cárcere e da morte, estar convosco, vós que deliberáveis o injusto”. É uma visão que a obra de ficção compartilha com Sócrates, de que, mesmo se as leis são perfeitas, elas podem ser aplicadas injustamente por aqueles que buscam seus próprios interesses.

Da mesma forma, este desapego à vida expressa na frase creditada a Sócrates acima, e em diversas outras afirmações dele, é ecoado em espírito por todo o filme “300 de Esparta”. Especialmente quando o narrador onisciente revela pensamentos como os que seguem:

“E mesmo quando (Leônidas) lidera seus preciosos 300 para a morte certa, seu único arrependimento é que ele tem tão poucos para sacrificar”.
“... os 300 meninos atrás dele, prontos para morrer por ele, sem um instante de hesitação. Cada um deles. Prontos para morrer. Eles pensam que sabem o que isto significa”.
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Frank Miller, autor dos quadrinhos e do filme, tenta também expressar com esta frase que não apenas os soldados não sabem o que é a morte, apesar de se pensarem prontos para ela, mas que eles também não compreendem o significado que suas mortes terão no âmbito da guerra e para a história. Ponderações que não devem ser perdidas também pelo leitor de Sócrates, quando lê a forma serena com a qual ele encara que sua própria morte está próxima. Para Sócrates, a morte se oferecia como uma de duas boas possibilidades: Ou a de descansar eternamente, ou a de encontrar do outro lado aqueles que morreram antes dele, e travar animadas discussões com os grandes pensadores e personalidades do passado. Ele vê o fim da sua vida como uma propícia jornada, algo que apetece seus sentidos de investigador e contestador.
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Tanto o filme “300 de Esparta” quanto o julgamento de Sócrates acabam em derrotas com gosto de vitória. Os exércitos de Xerxes, usando de traição e de seus números superiores, eventualmente conseguem destruir as remanescentes tropas espartanas, depois de um conflito de três dias. Historiadores estimam que o exército grego original, composto de 5,500 homens, incluindo os 300 de Esparta, tenha tido por volta de duas mil baixas, sendo os sobreviventes desertores. No entanto, dizem que o exército de Xerxes sofreu algo como 30 mil baixas. Não apenas isto, mas o sacrifício daqueles 300 e do rei consolidam a posição de Esparta contra Xerxes, dão tempo para que os atenienses se recuperassem e vencessem suas batalhas no mar, e um exército de 40 mil gregos, liderados por 10 mil espartanos, eventualmente derrota Xerxes no confronto terrestre. A Batalha das Termópilas até hoje se mantém como um exemplo de como, através de estratégia, controle territorial e treinamento superior, um pequeno contingente de soldados pode derrotar um exército.
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Da mesma forma, mesmo morrendo, Sócrates se imortalizou através do seu pensamento, em muito exposto em seu julgamento e derradeiras argumentações. Não só isto, mas também pelo fato de que ele consegue remover de si o peso moral da condenação e passá-la para seus acusadores e àqueles que o condenaram, condenando a eles pela injustiça. Considerou ele: “Assim, eu me vejo condenado à morte por vós, condenados de verdade, criminosos de improbidade e de injustiça. Eu estou dentro da minha pena, vós dentro da vossa”. E destes que o acusaram, poucos foram os feitos dignos de serem lembrados, além dos que os levaram a serem mencionados no texto de Platão, que os imortalizou na infâmia. Enquanto Sócrates vive para sempre, a influenciar a mente dos jovens e torna-los melhores.

- Texto por Carlos Senna